Rumo ao Bi, há 10 anos virávamos sobre o Banfield
A Libertadores tem um ritmo diferente. Soa, aos ouvidos do apaixonado por futebol, como a mais harmônica mistura da cumbia com o tango, passando pelo samba e o reggaeton. Envolvente disputa, consegue impor a uma equipe, durante breves 90 minutos, emoções que variam da alegria ao drama, do sofrimento à explosão. Aquele que deseja a Copa deve superar, com maestria, um caminho feito para lhe causar percalços. A melhor maneira ser bem-sucedido na empreitada? Contando com a força de uma casa que esteja à altura da mística do torneio.
Em 2010 tropeçamos, é inegável. Não por fraqueza, e sim devido às armadilhas que visitaram nossa campanha. Diante de acanhado alçapão hermano, enfrentando hostil arbitragem charrua, com direito a pênalti sonegado e expulsão polêmica forçada, sucumbimos para o Banfield, apesar da belíssima pintura de nosso lateral – pouco depois sacado de campo pelo homem do apito.
Para avançar às quartas, portanto, o Inter dependia de vitória por placar superior aos de vantagem mínima. A alternativa, única, residia em fazer a diferença no Beira-Rio. Afinal de contas, por mais que a esperança parecesse dançar na corda bamba de sombrinha, em nossa casa não seria justo que nos machucássemos.
“A energia que vem da
arquibancada faz a diferença.
Ela contamina todo
mundo em campo.”
GUIÑAZÚ – semana anterior ao confronto
O crepúsculo da quinta-feira 6 de maio foi mais rubro do que de costume. Mobilizados para o duelo das 19h30, 35 mil colorados e coloradas migraram cegamente à Padre Cacique, certos de que, naquela data, apenas para o Gigante os caminhos poderiam convergir. Iniciado o confronto, se é verdade que as arquibancadas ainda não estavam tomadas, fruto do caótico trânsito de final da tarde na capital gaúcha, já eram numerosos os que cantavam nas arquibancadas do Beira-Rio.
Tão intenso quanto o movimento de chegada ao Estádio, por óbvio, era a cantoria que dele emanava. Irretocável no Beira-Rio até então, acumulando três vitórias no torneio continental, o Inter pisou em campo sabendo que, por mais dura que fosse, a missão nada tinha de impossível. Ideia comprada pela torcida, convencida pelos comentários do gigante Guiñazú.
Em perfeita sintonia, grama e cimento sufocaram os argentinos, não permitindo um mísero segundo de descanso. Conduzidos – time e torcida – por um endemoniado D’Alessandro, os colorados lamentaram chances perdidas por Andrezinho e Walter, criadas pelo camisa 10, e também finalização do argentino que explodira no travessão. Conforme a chegada do intervalo se aproximava, o medo começava a crescer entre os mais pessimistas. Neste instante, contudo, o regente Andrés voltou a dar as caras.
Com passe milimétrico, D’Alessandro deixou Andrezinho de frente para o goleiro. Genial, o anjo das cobranças de falta serviu Alecsandro que, com a meta aberta, teve o simples trabalho de completar. Agora, faltava um.
Abençoado momento dos vestiários, permitiu ao Gigante descansar. Pulsando intensamente, o quarentão Beira-Rio precisava de um respiro. Breve, é claro, pois poucas são as construções tão habituadas ao delírio das massas quanto o templo colorado. A importância do quarto de hora de relaxamento foi comprovada logo cedo, com D’Alessandro, mais uma vez ele, lançando Eller.
Cobrindo a lateral-esquerda, o zagueiro vencedor de América e mundo em 2006 avançou e suspendeu. Na cabeça de Walter. Testaço para as redes! Virávamos. Juntos.
Encaminhada a vaga, o escrete colorado não cessou. Como poderia, se finalmente percebia os primeiros ares de classificação despontando no horizonte? As chances perdidas até motivaram um suspiro ou outro de nervosismo, mas a expulsão de James Rodríguez, jovem craque do rival, e o sucessor apito final libertaram, de uma vez por todas, o otimismo alvirrubro. Estávamos nas oitavas, graças à determinação de um Estádio que não cansou de jogar.